Da construção da identidade à construção da memória: quem constrói no ambiente digital?

Este texto apresenta o discurso de Dr. Hadi Saba Ayon (pesquisador na rede de pesquisa Francesa CDHET na Université Le Havre Normandie) no segundo Seminário Internacional de pesquisa em Design organizado pelo Departamento de Design na Universidade Federal de Brasília (UnB), 13-14 de Novembro de 2018 no Espaço cultural Renato Russo em Brasília.

A sua abordagem se inspira de e se apoia ao texto de Marcello Vitali-Rosati (Université de Montréal no Canadá; Twitter: @monterosato) intitulado “Pour une pensée préhumaine” (2018).

-As fotos são da Louise Merzeau (@lmerzeau)

-As ilustrações são da Laísa Rebelo (@laisarebelo)

Como situar o indivíduo no mundo contemporâneo? Podemos falar de mutação cultural, tecnológica, mas também antropológica que o digital está produzindo em nossas sociedades por meio da rastreabilidade e da memória? Podemos entender a comunicação como uma ultrapassagem da interação social ao rastro digital, de construção da identidade à construção da memória?

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Pensar ou repensar o indivíduo em relação com seu mundo é questionar ou re-questionar o construtivismo (de século XX) que marcou trabalhos em várias áreas científicas- especialmente em antropologia, em comunicação, em antropologia da comunicação e em sociologia (referências de nossa reflexão hoje), e em particular duas Escolas americanas, aquelas de Chicago (interacionismo simbólico) e de Palo alto (construtivismo).

Pensar o indivíduo em relação com o digital é pensar a relação entre a calculabilidade e o pensamento. É interrogar o processo da rastreabilidade digital e suas consequências sobre a construção da sociedade, bem como sobre o humano, um “Homem-rastro” (Béatrice Galinon-Mélénec, 2011) , um produtor de rastros e ao mesmo tempo uma construção de rastros, o todo funcionando em um ciclo e em um continuum, fazendo sistema.

Calculabilidade e pensamento?

O rastro e a cultura digital foram objetos de trabalho e análise por diversas escolas e correntes recentes, em particular a Escola Francesa sobre o rastro (que reuni professores e pesquisadores de várias áreas e diferentes Universidades Francesas) e outras correntes canadenses em Humanidades Digitais (Digital Humanities), em particular na Universidade de Montréal e de Ottawa que estudaram os usos, as condições e os desafios dessa nova cultura, que o Pierre Lévy chama de “Cibercultura” (1997-1999).

Nesta apresentação, vou tentar pensar e debater com vocês (em breve, em menos de 20 min) duas noções, a identidade e a memória, em uma abordagem epistemológica, histórica e contemporânea, aquela de construtivismo e sua versão na era digital. De construtivismo até a teoria de Editorialização (sugerida pelo Marcello Vitali-Rosati e al.) vou questionar as novas formas e os novos processos de ter/fazer identidade (design) e memória.

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Construtivismo

“Pode-se separar o pensamento e o ser?”, pergunta-se Marcello Vitali-Rosati em seu recente artigo intitulado “Pour une pensée préhumaine” (Por um pensamento pré-humano), apresentado na conferência “Repenser les humanités numériques/Re-thinking the Digital Humanities”-“Repensar as Humanidades Digitais” na Universidade de Montréal em Outubro de 2018.

O pensamento deveria ser necessariamente humano? O tempo que estamos vivendo, ele adiciona, nos empurra a fazer a pergunta novamente porque as mudanças técnicas que a caracterizam são baseadas na questão do humano e sua relação com o não-humano, o maquínico e a técnica.

Historicamente, o construtivismo vem da filosofia da ciência. Este campo de estudo procura, em particular, entender o que funda o conhecimento e, em particular, os critérios que fazem que uma atividade seja denominada científica. O construtivismo refere-se à uma abordagem baseada na construção do objeto/realidade pelo sujeito.

Segundo a teoria de Kant (que é às vezes estudada sob o termo da revolução copernicana), o conhecimento dos fenómenos resulta de uma construção realizada pelo sujeito. Mas Kant, nunca formulará a estratégia construtivista com clareza (Rockmore, 2007) .

Cada coisa pode ter suas próprias qualidades, independentemente de serem percebidas por um sujeito ou não? As qualidades podem ser primárias e secundárias. As primeiras são qualidades próprias, independentemente de serem percebidas por um sujeito ou não. As segundas dependem dos modos de percepção.

A distinção entre essas duas qualidades é criticada por Kant. Segundo ele, essa distinção é dogmática porque não pode ser demonstrada. Ele escreve no livro Prolegômenos – A Qualquer Metafísica Futura Que Possa Apresentar-Se Como Ciência (1865):

“Eu digo, ao contrário, que as coisas nos são dadas como externas a nós e ajustáveis aos nossos sentidos, mas que nada sabemos sobre o que elas podem ser em si mesmas, que só conhecemos seus fenómenos; isto é, as representações que fazem em nós quando afetam nossos sentidos”.

O construtivismo hegeliano é entendido como uma reação ao proposto por Kant. Hegel explora ainda a estratégia construtivista na Fenomenologia do Espírito. Em sua introdução, ele descreve como a identidade do sujeito e do objeto é construída. O conhecimento é transformado em verdade no ponto final, onde sujeito e objeto, aquele que sabe e o que sabemos, liberdade e necessidade se sobrepõem.

O “construtivismo hegeliano” monstra que o ser humano está sempre situado em um contexto social; que não há conhecimento a priori, mas apenas a posteriori, e que o conhecimento não é teórico no sentido kantiano, mas, pelo contrário, prático.

“O construtivismo hegeliano se resume a um processo de formular e testar teorias sucessivas, ou trabalhar hipóteses, submetendo-as à prova da experiência” (Rockmore, 2007).

De acordo com Hegel, nós não avaliamos nossas afirmações cognitivas absolutamente, nem abstrata nem teoricamente, nem mesmo no plano a priori, mas apenas no plano posterior.

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Interação social

É nesse sentido que o interacionismo simbólico entende o humano, como ator interagindo com seu ambiente. George Herbert Mead (figura de referência dessa corrente) distingue duas formas de interação: não-simbólica e simbólica. Os participantes de uma interação não-simbólica respondem diretamente às ações dos outros. Enquanto no segundo, as pessoas trocam indicações e símbolos, definem a situação e interpretam suas respectivas ações agindo com base no significado produzido por essa interpretação.

Assim, o comportamento individual não é completamente determinado nem completamente livre, é parte de um debate permanente que permite a inovação. A interação é a única medida de análise. Seguindo Mead, o Self é o resultado da relação de um indivíduo com seu ambiente social. O processo de experiência social não é psicológico, mas é realizado em “uma transação particular entre um organismo físico e seu ambiente social: a comunicação” (Bonicco-Donato, 2014) .

De acordo com Mead, o Self é uma construção social e pode funcionar como um objeto e agir como mediador, fornecendo estímulos para controlar a ação. O Self também pode funcionar como sujeito, a nossa singularidade reflexiva, frente à adoção de atitudes do “outro”.

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Construtivismo e realismo

O construtivismo faz parte de um debate que se opõe ao realismo. O objeto do confronto é como o conhecimento é adquirido e, em particular, o papel do pesquisador nesse processo.

O realismo supõe a existência de uma realidade objetiva independente do humano: os objetos de pesquisa são considerados independentes do observador e a influência que pode ter sobre seu objeto é ignorada. Se o objeto é verdadeiramente independente, então não há laço cognitivo que nos permita conhecê-lo. Neste caso, não se pode “credivelmente” afirmar conhecer um objeto independente, por exemplo, um objeto externo, tão fora da mente/do espírito.

Quanto ao construtivismo, ele propõe estudar uma construção social de objetos e fenômenos.

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Seguindo o realismo, temos um mundo que existe independentemente de nós, e que é totalmente inacessível para nós. Por outro lado, temos um mundo que existe apenas porque temos acesso a ele, mas isso não tem outra existência do que em nosso acesso a ele.

Isso significa que para acessar ao mundo, o mundo tem que existir antes de nos, e o nosso acesso vem depois? Para resolver esse paradoxo, certos idealistas, como George Berkeley, acharam uma explicação: o mundo é apenas o acesso ao mundo, acesso que seria o resultado de uma mediação original, eterna e primária. A mediação não seria um gesto feito pelo sujeito para acessar o mundo, mas uma dinâmica inscrita no próprio mundo.

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Digital

No ambiente digital, cada atividade produz/deixa rastro-s. Esses rastros são produzidos automaticamente (qualquer atividade conectada) e desaparecem à nossa visão e apreensão. São tratados em processos invisíveis que fogem do controle de usuários.

Homem/Mulher-rastro?

“É impossível não deixar rastros” escreve Louise Merzeau (2016) emprestando a famosa expressão da Escola de Palo alto “É impossível não comunicar” (não ter comportamento). Seguindo Alain Mille (2013), o rastro digital é constituído a partir de pegadas digitais deixadas (voluntariamente ou não) no ambiente informático durante os processos computacionais. Os rastros digitais não são mensagens. Eles são “unidades isoláveis, receptivas e calculáveis” (Roger T. Pédauque, 2006).

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Existem vários tipos de rastros (George, 2009; Merzeau, 2013):

              1. Os “rastros de navegação” (que automaticamente afirmam o que um usuário comenta, para onde ele está indo, como ele se comporta);
              2. os “rastros declarativos de perfil” (O que um usuário afirma de si mesmo);
              3. os “rastros ativos” (o que um usuário expressa, o que ele publica, o que ele edita, o que ele produz);
              4. os “rastros calculados” (que se refere ao que o próprio sistema calcula).

Nossos rastros?

O digital chegou a um estágio em que não é mais possível pensar no termo instrumentação, ferramenta, externalidade (…) uma quantidade incrível de objetos, gestos, atividades, incluindo o mais familiares e diários integram hoje uma parte do digital. Isso resulta em uma situação onde o digital não está mais restrito aos objetos identificados como tais, computadores, celulares, tabletes, etc., é cada vez mais em todos os lugares em nosso ambiente (Merzeau, 2016). De acordo com Milad Doueihi (2013), o digital é “um ecossistema dinâmico animado pela normatividade algorítmica e habitado por identidades polifônicas capazes de produzir comportamentos perturbadores”.

O conceito de Humanidades Digitais levanta a questão da definição do humano e sua relação com a tecnologia e as máquinas. Milad Doueihi propõe em 2011 a noção de HUMANISMO DIGITAL (Pour un humanisme numérique), porque o digital não pode ser considerado como um simples conjunto de ferramentas, mas é uma cultura em si que muda nossa relação com o mundo e, finalmente, o nosso modo de ser humanos.

Mas como podemos entender a rastreabilidade digital? Ela “não é uma camada documental que surgiria depois de uma atividade, mas a própria condição de sua execução” disse Louise Merzeau (2013). O Self “Meadiano” é progressivamente constituído no processo de atividade social; a identidade digital não é. Ela é uma coleção de rastros. São os algoritmos que constroem essa identidade via a indexação de rastros. A identidade calculada, de que fala Fanny George no trabalho intitulado “L’identité numérique dans le web 2.0” (2008), é produzida a partir de um processamento da identidade ativa (dando pelas atividades de usuário) pelo sistema. Nesse processo, a construção identitária se realiza fora do sujeito, de sua presença e de seu acesso ao objeto.

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O desafio da identidade digital hoje é que ela reúne o que se refere à nossa singularidade, nossa continuidade, nossos lugares de vida reais, mas ao mesmo tempo estamos no código, nos algoritmos, nas massas (de dados) que só podem ser processadas por máquinas e por modos de tratamento que servem para outras finalidades além de nossos fins pessoais.

Tratamentos maquínicos…

Estudar as redes sociais digitais nos leva para pensá-las como locais de armazenamento, disse Louise Merzeau. Nós enfatizamos a dimensão relacional ou comunicacional (industrial e de marketing), mas raramente pensamos nelas como locais de armazenamento.

Memória

Por muito tempo pensamos a memória em relação com o passado, como se for coisas que se acumulam ou se perdem, mas que estão por trás e que estão nas adegas, e que se acumulam em raios com poeira. A memória do humano é limitada, então ele deve inventar ajudas e próteses de memória para corrigir essa memória defeituosa. Acreditamos que para não esquecer, temos que memorizar. Tudo o que produzimos, escrevemos, arquivamos, serve para salvar e guardar pequenas parcelas que vão escapar por algum tempo ao esquecimento.

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No mundo digital, as ferramentas, os suportes e o ambiente produzem uma inversão “antropológica”: não é mais a memória que é o fundo, é o esquecimento (sua regulação) que exige esforço, investimento e atenção. A “memória” é presente, automática e caótica. Toda atividade deixa rastros, tudo é memorizado automaticamente, instantaneamente, muitas vezes sem ser desejado, sem ser conhecido e sem ser controlado. Como e porque fazer memória na era digital?

Memória digital?

Pensamos por algum tempo que essa memória (digital) automática realizaria o auto-arquivamento de nossa modernidade e que a Internet realizaria o mito memorial da biblioteca integral. Mas a rastreabilidade digital revela hoje o que é: uma anti-memória em favor de uma previsibilidade do comportamento. Convertidos em coleções de rastros que eles não controlam mais, tanto os indivíduos quanto os coletivos devem se reinventar com áreas comuns que carregam perspectivas/objetivos memoriais, heurísticos e políticos. No ambiente digital, preservar não significa fixar, mas duplicar, circular e reciclar. Mais de que restringir ou proteger seus dados, o usuário tem interesse em fazer um rastreamento, ou seja, inserir seus rastros digitais em uma comunidade, contexto e temporalidade. Fazer memória digital significa construir um projeto comum com objetivos e governança comuns. Essa construção se realiza entre dois: o humano e o não humano.

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Na Digital, existem indivíduos, comunidades e ambientes digitais que interagem e dão origem ao espaço digital. Mas há também um AMBIENTE que é o resultado dinâmico de um conjunto de interações entre diferentes forças. Essas interações surgem após indivíduos, comunidades e ambientes digitais.

As comunidades em rede?

A editorialização, noção sugerida pelo Marcello Vitali-Rosati, significa um conjunto de dispositivos técnicos e tecnológicos, de modo que as plataformas, a ergonomia, os gráficos, as palavras-chave, os links, os metadados e todas as atividades que permitem que um conteúdo seja produzido, formatado para um suporte digital e depois divulgado e acessível. Ela é um processo que está aberto no tempo e no espaço, porque o conteúdo não se limita a existir em uma plataforma, mas vive porque é divulgado e disseminado em múltiplas plataformas.

“A editorialização pode ser pensada como o conjunto de condições materiais de mediação que determinam a emergência de um mundo. Ela é um acesso ao mundo que é feito com o próprio mundo”, escreve Vitali-Rosati.

Da mesma maneira que eu penso um objeto ou um sujeito, o ambiente, ou os ambientes digitais pensam esse objeto ou esse sujeito. O acesso ao rastro digital é uma inscrição, material e concreta, e não é humano.

Quem constrói no ambiente digital? Pergunto mais uma vez porque as mudanças técnicas que caracterizam a nossa época são baseadas na questão do humano e de sua relação com o não-humano, ao maquínico e ao técnico.

Fim.

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Culture numérique et ville inclusive ? Webinaire international à Rio Branco-Acre (Brésil, 2018)

Discours d’ouverture du Webinaire « Culture numérique et ville inclusive », 1ère Rencontre Internationale sur le numérique et la ville, organisé à Uninorte-Acre (Rio Branco, Brésil), le 21 novembre 2018.

-Solange Chalub , Coordinatrice des études supérieures et de Biologie à Uninorte-Acre au Brésil.
-Hadi Saba Ayon, Chercheur CDHET à l’Université Le Havre Normandie en France; E-laboratory on Human Trace Unitwin Complex System Digital Campus UNESCO.

Solange

Solange Chalub. Source : Rose Sabóia.

Bom dia a todos! Bem vindos ao Webinar “Cultura Digital e Cidade Inclusiva” – 1º encontro Internacional sobre o digital e a cidade, realizado pela UNINORTE-Acre, Brasil, em parceria com Instituições da França, Canadá, Itália e Brasil.

Minhas saudações, em nome da diretoria do Centro Universitário UNINORTE ao:

-Dr. Hadi Saba Ayon, idealizador e parceiro na organização do Evento e aos professores/pesquisadores/consultores/diretores internacionais e nacionais:
-Sra. Béatrice Galinon-Mélénec, Université Le Havre Normandie, França;
-Sra. Marie Delaroque, Côté Cours, Le Havre, França;
-Sra. Armony Altinier, Koena, Paris, França;
-Sra. Agnès d’Arripe, Université Catholique de Lille, França;
-Sr. Marcello Vitali-Rosati, Université de Montréal, Canadá;
-Sr. Jean-Pierre Robin, Réseau international sur le processus de production du handicap, Québec, Canada;
-Sra.Maria Fernanda Arentsen, Université de Saint-Boniface, Manitoba, Canadá;
-Sra. Lucia de Anna, Italian University of Sport and Movement “Foro Italico”, Roma, Itália.
-Sra. Salete Maria Chalub Bandeira, Universidade Federal do Acre, Brasil;
-Sr. Armando Borges, Núcleo Estadual de Tecnologia Assistiva (NETA). Servidor público do Estado do Acre/ Brasil;
-Sra. Simone Maria Chalub Bandeira Bezerra, Universidade Federal do Acre, Brasil.
Aos professores Vander Nicácio e Janeo Nascimento, professores da UNINORTE, parceiros na organização deste Evento.

PalestrantesMeus cumprimentos a todos os participantes e à equipe de apoio. Pretendemos, a partir deste Webinar, provocar muitas discussões, reflexões e novas ideias/projetos que venham reforçar a inclusão, a melhoria no modo de vida das pessoas em comunidade.

Queremos ajudar a superar as barreiras que muitas pessoas têm quanto ao melhor uso do digital e, por fim, queremos fortalecer uma rede de pessoas sensíveis a esse tema; queremos aproximar esses pesquisadores e tornar mais conhecidas suas pesquisas, tão importantes para minimizar e ou até mesmo eliminar os obstáculos enfrentados na atualidade frente a esta questão; queremos influenciar outros pesquisadores, professores e estudantes, de forma que possam contribuir para minimizar/eliminar esses problemas.
Excelente evento a todos! Muito obrigada!
Agora, passo a palavra para o Dr. Hadi Saba Ayon, que dará continuidade ao nosso Webinar.


Webinaire 001

Hadi Saba Ayon. Source : Rose Sabóia.

Bom dia, Bonjour, Bon matin, Good morning,

Mesdames, Messieurs,

Pourquoi la culture numérique et la ville inclusive ?

Ce projet, le webinaire-qui est le résultat d’une longue tournée/mission d’enseignement et de recherche dans plusieurs États Brésiliens au Acre, à Bahia et à Brasília en 2018-, est issu d’une intiative individuelle qui est devenue collective, et qui s’inspire des travaux de recherche et d’action dans le domaine des « Humanités numériques » et des « Sciences du handicap ».

Ces travaux, en majorité français et franco-canadiens, questionnent l’humain à l’ère du numérique le définissant comme un « Homme-trace » conformément à Béatrice Galinon-Mélénec (2011); questionnent la traçabilité numérique et ses enjeux sociétaux; l’humain et son rapport au non-humain selon Marcello Vitali-Rosati (2018); questionnent l’ « humanisme numérique » selon Milad Doueihi (2010) qui est une culture qui modifie notre rapport au monde. Ces travaux interrogent aussi le handicap compris comme « une variation du développement humain » suivant Patrick Fougeyrollas (2010); les facteurs qui produisent la situation du handicap; les habitudes de vie des personnes ayant des incapacités; et les pratiques de participation sociale dans l’espace urbain.

Ce webinaire se réfère à des contributions/réflexions scientifiques, des colloques et des discussions présentielles et en ligne (sur Twitter, Youtube, des blogs de recherche et d’autres espaces web), notamment ceux de l’Ecole Française sur la Trace, de l’E-laboratory on Human Trace unitwin complex system digital campus à l’UNESCO, des chercheurs québecois à l’Université de Montréal, à l’Université Laval, au Réseau international sur le processus de production du handicap- qui a publié en novembre de cette année sa nouvelle Classification (Modèle de développement humain-Processus de production du handicap-MDH-PPH).

Ce projet se veut un pont entre l’Amérique du Sud et l’Europe et l’Amérique du Nord. Un pont non pas que pour le passage et l’échange de l’information et de la connaisance, mais surtout pour la structuration d’un débat riche et fructueux et d’une construction en réseaux qui prend en compte la dimension mondiale et interdisciplinaire des grands enjeux du numérique et de ses usages inclusifs dans la ville.

Rassemblant des chercheurs de disciplines et horizons divers, mais aussi de différents pays, le webinaire met la pierre angulaire d’une collaboration ambitieuse entre des chercheurs Brésiliens et internationaux, appelant à la traduction des travaux académiques et des publications scientifiques de français en portugais et du portugais en français pour faciliter ces échanges.

Le webinaire se veut aussi comme un prolongement du colloque international « Pour une ville inclusive : innovations et partenariats » organisé par le RIPPH à l’Université Laval au Québec les 8-9 novembre 2016.

Ville inclusive Québec

En connectant la ville à l’ « environnement numérique » (Louise Merzeau), le webinaire présentera des travaux :

    • sur l’accompagemnt des personnes ayant des incapacité psychique en France (avec Béatrice Galinon-Mélénec de l’Université Le Havre Normandie et Marie Delaroque de l’association Côté Cours au Havre en France);
    • sur l’inclusion et l’accessibilité du Web (avec Armony Altinier de Koena pour l’accessibilité numérique au service de l’inclusion des personnes handicapées en France);
    • sur l’usage du numérique par des personnes en situation de handicap (avec Agnès d’Arripe de l’Université Catholique de Lille en France);
    • sur la théorie de l’éditorialisation (avec Marcello Vitali-Rosati de l’Université de Montréal au Canada);
    • sur les représentations sociales du handicap dans le dialogue social (avec Maria Ferananda Arentsen de l’Université de Saint Boniface au Canada);
    • les risques d’exclusion à l’ére du numérique (avec Jean-Pierre Robin du Réseau international sur le processus de production du handicap au Canada);
    • sur la technologie numérique dans l’éducation (avec Lucia de Anna de l’Université de Rome “Foro Italico” en Italie);
    • sur les pratiques inclusives et la formation des enseignants (avec Salete Maria Chalub Bandeira de l’Université Fédérale de l’Acre au Brésil);
    • sur le coaching des fonctionnaires publics ayant une déficience visuelle (avec Armando Borges dos Santos du Service de la téchnologie d’assistance à l’État de l’Acre au Brésil);
  • et finalement sur la technologie numérique dans le contexte des pratiques scolaires (avec Simone Maria Chalub Bandeira Bezerra de l’Université Fédérale de l’Acre au Brésil).

Permettez moi, en parlant du numérique, d’avoir un pensée particulière pour Louise Merzeau, professeure/chercheuse et amie de l’Université Paris Ouest Nanterre La Défense, qui est décédée l’an dernier, et qui a marqué par ses travaux la recherche Française et francophone sur le numérique. Ses traces resteront des indices de son reyaunement et des références pour de futur discussions et productions.

Louise Merzeau

Louise Merzeau

Merci au Centre Universitaire Uninorte-Acre qui acceuille ce webinaire/notre webinaire, et à vous tous pour votre participation.

Comment penser le numérique qui modifie notre rapport à la politique, aux choses, à nous-mêmes et à l’espace ? Comment peut-on définir la ville inclusive pour tous et quelles seraient les mesures à prendre en faveur de la population ayant des incapacités ?

Tant de questions à voir tantôt.

Merci et bon webinaire à vous tous.

Ci-dessous le support de la conférence “Handicap et ville inclusive” organisée à Uninorte-Acre en août 2018:

https://drive.google.com/file/d/1ZFWW09pmjweNPnytdl9aS3LaVsG9CpYQ/view

Apropriar-se os rastros digitais em um design coletivo-UnB, Brasília 2018

Como transformar a rastreabilidade digital em um ato memorial através de projetos individuais e coletivos (arte, escrita, documentação, etc.)? Como entender a ultrapassagem da interação social (George Mead e o interacionismo simbólico) ao rastro digital (Escola Francesa sobre o rastro)?

Sylvia F.3

Sylvia Fredriksson (de Paris) falando dos comuns digitais. Fonte: sabáeu

A disciplina “Da construção identitária à construção da memória” no Departamento de Design na UnB-Brasília (novembro 2018), administrada pelo Dr. Hadi Saba Ayon (CDHET, Université Le Havre Normandie França, e outras afiliações internacionais), questionou a cultura digital e suas mutações sociais e culturais.

As participantes interrogaram a informação, a comunicação, o design e a memória na erá digital. Elas construíram um projeto coletivo “Design da visibilidade” na forma de website, com três eixos que convergem com as pesquisas (mestrado em Design) delas: Cidade, Comunidade e Identidade.

Site designdavisibilidade

Designdavisibilidade.wordpress.com

A conversa com Sylvia Fredriksson, pesquisadora e designer Francesa, organizada em um webinário sobre a cultura digital e os comuns, trouxe novas reflexões sobre o “terceiro-lugar’, os “comuns digitais”, o “software-livre” etc. Ela girou novas pistas para desenvolver as pesquisas e pensar em cooperação internacional.

Se a interação social é simbólica na medida em que envolve um processo de interpretação – pelo qual alguns estabelecem o significado das ações e observações de outros – e de definição – pelo qual lhes comunicam, em retorno, indicações do que eles preparam-se para fazer, a interação digital é diferente. Os rastros digitais não são símbolos/significados como os outros. Porque eles são destacáveis, mobilizáveis, e calculáveis. Eles não são mensagens e não tem código de interpretação. O que vai torná-los significativos, mas especialmente eficazes, é sua combinação e seu processamento algorítmico.

Escola Francesa 1

Todas nossas atividades no digital deixam rastros. Esta rastreabilidade não faz memória. É uma memória maquínica (anti-memória) que precisa de organização. O trabalho memorial permite reunir o que foi espalhado ou desmembrado. No ambiente digital, a agregação [montagem] de memórias não é mais pensada em termos de deposição, mas de fluxo, relacionando a aquisição, a visibilidade e a reativação de rastros.

A ultrapassagem da tecnologia computacional para usos culturais desenhados no ambiente digital, ou de “computação” para “digital” (Doueihi, 2011), mudou a construção da sociabilidade e dos espaços que habitamos. Para ter uma presença (no digital), precisamos educar-se ao digital; aprender a re-documentarizar nossos rastros; arquivá-los a fim de produzir e compartilhar conhecimento comum. Mais do que uma auto-imagem, a cultura digital é baseada em um sistema conversacional alimentado por um processamento algorítmico de metadados: uma lógica dual de documentação e relacionamento.

Video de Louise Merzeau: Collège des Bernardins (2016). Vimeo.

No ambiente digital, preservar não significa fixar, mas duplicar, circular e reciclar. Porque o conteúdo é instável, ele deve ser dobrado por uma informação sobre a informação: o metadado. Associado a toda mensagem, o metadado não apenas descreve os enunciados, ele permite a segmentação, a distribuição e a recomposição.

Mais de que restringir ou proteger seus dados, o usuário tem interesse em fazer um rastreamento, ou seja, inserir seus rastros digitais em uma comunidade, contexto e temporalidade.

O hashtag #memorastrodigital que os participantes fizeram no Twitter permitiu uma redação coletiva com muitas observações e matérias sobre a apresentação e o debate. Para consultar o arquivo das observações do webinário, pode acessar neste link:

https://twitter.com/hashtag/memorastrodigital?src=hash

Pensamos a concepção de ambientes de informação como processos “que permitem uma interação entre Informática onipresente e design de serviço, onde o arquiteto da informação considera a coleção, a organização e a apresentação da informação como tarefas semelhantes às do arquiteto confrontado com o projeto de um edifício, [um e outro trabalhando] em espaços de design para existir, viver, trabalhar, brincar “(Resmini e Rosati, 2012).

arquitetura da info 1

Com agradecimentos e vontade para continuar os debates sobre os usos, as condições e os desafios da cultura digital, terminamos o nosso webinário e acabamos o nosso curso. Até o próximo encontro, deixamos uma memória coletiva no www.designdavisibilidade.wordpress.com e outros fragmentos documentares/de design em vários lugares praticados, documentados e re-documentados.

Referências:
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