
Rua Santo Antônio no centro histórico de Salvador (Bahia). Fonte: Valnice Paiva
Muita memória ou perda de memória que a rastreabilidade digital nos mostra? O que é a comunicação hoje? Como podemos fazer memória e por que fazer? Que tipo de memória queremos e por qual finalidade?
Organizado pelo grupo de pesquisa INTERFACES no departamento de Ciências Humanas na UNEB-Salvador na Bahia, o curso “Comunicação, rastreabilidade digital e memória” trouxe explicações mais também dúvidas sobre os desafios da rastreabilidade digital e as novas formas de comunicar.

Fonte: Curso de Hadi Saba Ayon (2018)
Apresentado pelo Hadi Saba Ayon (Ph.D. em Ciências da informação e da comunicação, membro na CDHET, rede de pesquisa sobre a Comunicação e o Desenvolvimento dos Homens, Empresas e Territórios na Universidade Le Havre Normandie na França), o curso abordou questões epistemológicas sobre a comunicação (face-a-face e digital), o rastro e as mutações da cultura digital sobre a memória.
Seja o rastreamento do endereço IP, o envio de cookies pelos servidores, o registro de históricos de transações, o arquivamento de solicitações por os motores de busca ou a preservação dos status pelas redes sociais, em cada uma de nossas conexões, nossa presença on-line é automaticamente identificada, rastreada e conservada por vários agentes técnicos, sem que seja possível subtrair da maioria desses processos.
Seguindo Louise Merzeau (2013), a rastreabilidade digital não é uma camada documental que surgira depois de uma atividade mas a própria condição de sua execução.

Curso de Hadi S.A. (2018)
Como podemos entender a comunicação na era digital? Seguindo a Escola Americana de Palo Alto, a comunicação não se relaciona apenas com a transmissão de mensagens verbais, explícitas e intencionais; mas “incluiria todos os processos pelos quais os sujeitos influenciam uns aos outros” (Bateson e Ruesch, 1951).

Curso de Hadi S.A. (2018)
Claro que essa definição da comunicação interpessoal não pode explicar o processo de comunicação hoje, que é mediatizado pela tecnologia digital e produzido em vários ambienteis instáveis e em movimento (entre os sujeitos, os objetos e os dois). Não esquecemos que a menor atividade no ambiente digital (conexão à internet, escrita, navegação, etc.) produz rastros (declarativos mais também automáticos). Eles não são mensagens. São “unidades isoláveis, combináveis e calculáveis” (Roger T. Pédauque, 2006).
Onde costumava significar o registro da produção cultural, a memória é agora a base de uma grande quantidade de produção cultural. As tecnologias digitais facilitam o que Lawrence Lessig (2008) e muitos outros chamam de “remix culture”, isto é, a apropriação e transformação de textos de mídia de massa (incluindo filmes, episódios de televisão, música gravada, videogames, quadrinhos, romances etc. ) em versões alternativas, com rastros dos textos “fonte”.

Curso de Hadi S.A. (2018)
No ambiente digital, todas as informações são gravadas e preservadas. Esse processo produz uma memória mecânica, uma “auto-memória” (Merzeau, 2011). Assim, o arquivamento se torna um passo essencial para a produção e a preservação de uma memória digital individual ou coletiva. A duplicação se torna uma propriedade necessária de qualquer objeto (Merzeau, 2013). A cópia é a condição da performatividade do digital. É a cópia que dá à rede o seu poder de se apresentar socialmente. Para que o conteúdo digital ser valorizado, deve ser duplicado.
Para fazer memória, precisamos de uma educação ao digital (Merzeau, 2014); aprender a re-documentarizar (Salaün, 2007) nossos rastros, arquivá-los a fim de produzir e compartilhar conhecimento comum.

Curso de Hadi S.A. (2018)
Como transformar a rastreabilidade em um ato memorial através de projetos individuais e coletivos (arte, escrita e outros)? Mais de que restringir ou proteger seus dados, o usuário tem interesse em fazer um rastreamento, ou seja, inserir seus rastros digitais em uma comunidade, contexto e temporalidade.
Os projeto-websites (memórias) construídos e apresentados pelos grupos de participantes no final do curso:
- Grupo de curso-Minha Negra Cor
- Grupo de curso-Unidiversidade
- Grupo de curso-#RastreiaUNEB
- Grupo de curso-Cibercultura na rede
- Grupo de curso-Militudas BA
- Grupo de curso-Meio ambiente News
Para consultar a redação coletiva no Twitter que fizemos no curso (a mini-memória):
https://twitter.com/hashtag/rastreiauneb?f=tweets&vertical=default&src=hash
Últimos momentos (notáveis) com os participantes em Salvador:
Referências:
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